A morte é um tema universalmente desafiador. Desde os primórdios da humanidade, o ser humano lida com o mistério da morte e o temor que ela desperta. Esse medo é uma experiência comum, motivada por diversas razões filosóficas, psicológicas e espirituais. Na doutrina católica, encontramos um caminho de esperança e confiança em Deus para superar esse temor, pois ela nos ensina a encarar a morte de maneira profundamente transformadora.
Por que Temos Medo da Morte?
O medo da morte pode ser atribuído a diversas causas. Uma delas é o medo do desconhecido: o que acontece após a morte é um mistério para muitos. Embora existam várias respostas, o desconhecido continua gerando insegurança e medo. Além disso, há o instinto natural de sobrevivência; biologicamente, o ser humano é programado para preservar a própria vida, o que cria uma resistência natural à ideia de fim da existência.
Outro fator é o apego à vida e às relações, a tudo aquilo que é visível. As experiências, as conquistas e os laços afetivos são valiosos, e a possibilidade de perder tudo isso provoca medo. Somado a isso, está o medo do sofrimento, pois a morte é frequentemente associada a doenças, dor e angústia, o que amplifica essa apreensão. Além disso, existem as incertezas espirituais.
Por fim, existe a percepção do eu. O ser humano é consciente de sua própria existência, o que gera uma angústia natural ao tentar imaginar o “não-ser”. A morte é vista como o fim da identidade e da continuidade da experiência pessoal, gerando resistência e medo.
O Sentido Cristão da Morte
A Igreja, através do seu Magistério, nos apresenta a morte a partir de uma perspectiva de fé e esperança. Para a Igreja, a morte não é o fim, mas uma passagem para a vida eterna, um caminho para o encontro definitivo com Deus. É a porta para voltarmos à convivência com Deus no Jardim. [Aqui busque a imagem no livro do Gênesis, onde Deus convivia pessoalmente com a humanidade, na pessoa de Adão (Gênesis 2)]. O Catecismo da Igreja Católica (CIC) ensina que, embora o medo da morte seja natural, ele pode ser superado pela esperança na ressurreição, pela confiança na misericórdia de Deus e pela compreensão do sentido cristão da morte.
– CIC 1020: “O cristão que une a sua própria morte à de Jesus vê a morte como uma ida para Ele e uma entrada na vida eterna.”
– CIC 1022: “Cada homem, depois de morrer, recebe em sua alma imortal a retribuição eterna, num juízo particular que põe sua vida em relação à de Cristo: ou através de uma purificação, ou para entrar imediatamente na bem-aventurança do céu, ou para condenar-se para sempre.”
A Igreja nos convida a ver a morte como um momento de encontro com Deus e uma transformação de nossa existência. Assim como Cristo venceu a morte, todos os que n’Ele creem também serão ressuscitados. Essa é uma das razões mais fortes para enfrentar o medo da morte, pois ela deixa de ser o fim para se tornar o começo de uma nova vida:
– CIC 1012: “A visão cristã da morte é expressa de modo privilegiado na liturgia da Igreja: ‘A vida dos que em Vós creem, Senhor, não é tirada, mas transformada. E, desfeita a morada deste exílio terrestre, adquirimos uma habitação eterna no céu.'”
Cristo Venceu a Morte
Para nós, a vitória de Cristo sobre a morte é central. São Paulo também se dedicou a tratar o tema escrevendo à comunidade de Corinto, quando declarou: “Onde está, ó morte, a tua vitória? Onde está, ó morte, o teu aguilhão?” (1 Coríntios 15, 55)
Essa certeza transforma nossa perspectiva sobre a morte, mostrando que Cristo venceu o que mais nos assusta. A liturgia expressa essa esperança com a oração, confiando nossa vida e nossa morte nas mãos de Deus e pedindo o auxílio da Virgem Santíssima, sob o título de Nossa Senhora da Boa Morte, e dos santos para o momento final:
– CIC 1014: “A Igreja exorta-nos a preparar-nos para a hora de nossa morte (‘De uma morte repentina e imprevista, livrai-nos, Senhor!’), a pedir à Mãe de Deus que interceda por nós ‘na hora de nossa morte’ e a entregar-nos a São José, o padroeiro da boa morte.” Além disso, a oração constante é uma fonte de conforto e força para lidar com o medo. Quando recitamos a oração da Ave-Maria, por exemplo, contém uma súplica direta para o momento de nossa morte: “Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós, pecadores, agora e na hora de nossa morte.”
Os Sacramentos como Apoio Espiritual
A Igreja oferece os sacramentos como preparação para enfrentar a morte com serenidade. Um exemplo é o sacramento da Unção dos Enfermos, que fortalece espiritualmente o fiel em seu momento de fragilidade e medo:
– CIC 1523: “A Unção dos Enfermos completa a nossa conformação com a morte e ressurreição de Cristo, tal como o Batismo começou a fazê-lo.”
A Vida é um Caminho de Volta para Encontrar Deus no Jardim
Em nossa espiritualidade, a vida terrena é vista como uma peregrinação rumo ao nosso destino final, o Céu. Essa visão ajuda a colocar a morte em perspectiva, entendendo-a como um passo necessário para estar com Deus. A morte, para o cristão, é a consumação do chamado de Deus para a santidade e para o encontro com Ele.
No início, mencionei a imagem de que estamos fora do Jardim, pois o pecado nos fechou o acesso, mas pela ressurreição de Cristo, o acesso foi liberado. Agora, precisamos saber fazer o caminho de volta.
Não Tenha Medo da Morte
O medo da morte é uma realidade humana, mas, à luz da fé, encontramos caminhos de esperança e confiança. A certeza de que Cristo venceu a morte, o ensino sobre a vida eterna e o apoio dos sacramentos e da oração são formas de transformar esse medo em uma confiança plena na misericórdia e no amor de Deus. Como cristãos, somos chamados a encarar a morte não como o fim, mas como o início de uma nova vida na plenitude do amor divino. Essa perspectiva nos convida a viver em preparação e fé, na certeza de que o fim de nossa jornada terrena é apenas o começo de nossa morada eterna junto ao Pai.
Gustavo Lucena, fvc
Membro associado da Comunidade de São Pio X